Olá mãe,
É estranho eu
te escrever essa carta. É mais estranho ainda eu precisar escrever para
conseguir conversar sobre esse assunto com você. Tudo isso é muito estranho. A
nossa relação é estranha. Mas mesmo sendo tudo tão estranho, eu gosto de você
assim, estranhamente. Você acredita? Acredita nisso mesmo depois de tantas brigas
e de tantos desencontros?
Eu sempre
quis que você fosse diferente, mãe. Eu sempre quis poder conversar abertamente
com você. Eu sofria toda vez que eu tinha que mentir ou omitir algo de você. Eu
queria te contar, mãe. Você acredita? Eu tive que procurar outras pessoas para
responder minhas dúvidas e me dar aquele colo de mãe que você não me deu. Eu
sempre quis saber como era poder se sentir seguro no abraço de uma mãe. Esperei
anos por uma iniciativa sua e adivinha? Nada. Você não fez nada. Você estava ao
meu lado todo dia mãe, mas ao mesmo tempo tão distante.
Você teve uma
grande participação em tudo isso que aconteceu, mãe. Não que eu queira por a
culpa que é minha em alguém, mas alguns erros meus foram reflexos dos seus.
Faltou conversa, amizade, cumplicidade. Eu ainda lembro o quanto eu queria que
você fosse melhor. O quanto eu queria que você fosse como a mãe das minhas
amigas. Quando a gente é novo, é difícil aceitar que mãe e pai também é ser
humano como a gente, que erra o tempo inteiro. Foi tudo tão complicado. Você
não estava lá pra me ensinar. Eu aprendi a aprender tudo sozinha e da minha
maneira.
Eu me decepcionei
com tudo mãe. Contigo, comigo, com os outros, com o mundo. Eu tive que aprender
sozinha e da pior maneira, quebrando a cara por ai. Eu tive que aprender a me
olhar no espelho e me orgulhar do que eu sou mesmo querendo mudar tudo. Eu tive
que aprender a parar de chorar porque não dá pra consertar o que já aconteceu.
Eu fiquei revoltada mãe. Eu ainda sou revoltada. Talvez nunca deixe de ser. Mas
eu já aprendi a lidar com isso, como aprendi com tantas outras coisas antes. Você
errou, eu errei e espero que esse ciclo vicioso termine por aqui.
E é aqui
nessa carta que eu termino com isso. Tá tudo esquecido, desculpado. Eu não me
perdoava pelos meus erros, pelo jeito que eu agi, pelas feridas que me causei.
Eu não me perdoava por não ter sabido viver direito. Eu me perdoei, agora te perdoo. Eu to esquecendo
de tudo isso. Quero viver sem essa culpa, sem essa mágoa. Quero seguir em
frente, livre. Eu sou durona, eu digo que não, mas se você se esforçar pela
primeira vez, eu juro que ainda dá tempo para mudar um pouco a situação. Por
favor mãe, não deixe mais tempo passar. Eu tenho medo de um dia ser tarde
demais.
Isso que eu
escrevi mãe, é sobre aquele assunto que nenhuma de nós quis falar ou admitir:
que mesmo sendo mãe e filha, nunca fomos amigas. Ainda dá tempo de ser? Eu
quero dar uma chance pra nós. Eu vou tentar ser melhor, espero que você tente
também. Quem sabe uma hora, a gente consiga se entender. Pra você ser minha
amiga e mãe.
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